Lorena: terra do Conde de Moreira Lima

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Palacete do Conde de Moreira Lima

No segundo dia que visitei Guaratinguetá, consegui terminar mais cedo meus trabalhos de pesquisa e dei uma esticada até Lorena, cidade vizinha. Uma cidade aprazível, com uma bela avenida calçada de pedras, alguns casarões históricos e um largo predomínio dos Salesianos. Além da UNISAL (Universidade Salesiana) há várias escolas geridas pela Congregação Salesiana. A UNISAL está para Lorena, como a UNITAU está para Taubaté. Ao que pude perceber, as freiras e os padres salesianos estão na cidade desde a última década do século XIX.

Visitei brevemente a Biblioteca Municipal, que possui em seu 2º andar o Arquivo Municipal. A responsável pelo Arquivo estava doente (e permaneceu nos 4 próximos dias) e por isso o local estava fechado para pesquisas. Conversei um pouco com o Maurício, atendente da Biblioteca Municipal e fui dar uma volta pelas redondezas para conhecer a cidade.

Logo percebi que o Conde de Moreira Lima era o grande “pai” dos lorenenses. A praça onde está a Biblioteca leva seu nome e também apresenta seu busto. Ao lado, há a Santa Casa de Misericórdia, que já levou seu nome, por ser patrono fundador. Caminhando para além da linha do trem, pude avistar uma belíssima Igreja, que num muro de azulejos na entrada pude notar que ela foi construída também pelo Conde. A Igreja São Benedito foi uma das obras mais suntuosas do Conde. Ele foi o responsável pela arrecadação de dinheiro na cidade para que fosse possível tamanha opulência dessa Igreja. Graças a seu esforço, conseguiu ter elevado seu título de Visconde para Conde em 1885, se tornando o único Conde do Vale do Paraíba. Isto ocorreu 1 ano após a visita de d. Pedro II, da Imperatriz Thereza Cristina, da Princesa Isabele Conde D’Eu em 1886.

Igreja de São Benedito

Aliás, a ascensão nobiliárquica do Conde de Moreira Lima está intimamente ligada às recepções que ele organizou para a Família Imperial, quando em viagem pela região e passagem pela cidade. Em 1882, Joaquim José Moreira Lima torna-se Barão devido a sua ajuda financeira na Guerra do Paraguai. Em 1884 recebe a Princesa Isabel na cidade e aproveita para encantar toda a comitiva Imperial com 2 grandes inaugurações: Igreja de São Benedito e o Engenho Central. A Princesa Isabel parece ter ficado bastante impressionada com o Engenho montado pelo então Barão de Moreira Lima, pois o descreveu como o mais avançado e moderno da Província de São Paulo. Um ano depois, o Barão torna-se Visconde.

Conde de Moreira Lima

Não contente, o Visconde de Moreira Lima preparou mais um surpresa para os Imperiantes. Em 1886, durante visita do Imperador d. Pedro II e sua esposa, a Imperatriz e da Princesa Isabel com seu marido, Conde D’Eu, Moreira Lima preparou 3 atos de enorme expressão para a cidade e para os importantes viajantes. Inaugurou a linha de bondes do Engenho Central, ligando a fábrica ao centro e à estação de Lorena. Somente para a visita do Imperador, a Câmara aprovou que fossem utilizados bondes à vapor, novidade à época em terras valeparaibanas. Além disso, ciente de que d. Pedro II estava interessado na ampliação da iluminação pública do país, o Visconde também inaugurou a iluminação à gás de hulha na Igreja de São Benedito e em seu Palacete, onde hospedara toda a Família Imperial.

Mas, o acontecimento mais significativo na cidade de Lorena foi outro. Apesar do Visconde não ter organizado formalmente, foi amplamente beneficiado pelo histórico ato. Sabendo da visita do Imperador, os vereadores da Câmara Municipal organizaram a compra de um Livro de Ouro, onde deveriam colher assinaturas e doações em dinheiro para a compra de cartas de alforria. Este ato simbólico já estava ocorrendo nas cidades do Vale fluminense. Segundo as atas da Câmara de Lorena daquele período, a primeira assinatura deveria ser de d. Pedro II. E foi o que aconteceu. O Imperador não só assinou, como doou 500 mil réis para a comissão responsável. Também foi organizada uma outra comissão que deveria arrecadar dinheiro suficiente para libertação de 2 escravas. As cartas de alforria dessas 2 escravas foram entregues pessoalmente pela Princesa Isabel. Dessa forma, a cidade de Lorena ficou na memória da Família Imperial, que não se esqueceu do Visconde de Moreira Lima. Em 1887, por decreto, d. Pedro II o elevou de Visconde para Conde de Moreira Lima.

Esse é um dos exemplos que ilustram perfeitamente o meu estudo. As viagens do Imperador e de sua filha eram utilizadas para reforçar seu poder nas cidades e regiões distantes da Corte, enquanto, por outro lado, o poder local aproveitava a honra de ter d. Pedro II na região de seu domínio para reafirmar seu poderio local e angariar uma inserção maior na sociedade e na política da época.

Estação Guaratinguetá

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Da terra de Monteiro Lobato fui visitar a terra de Frei Galvão. Guaratinguetá, a 4ª maior cidade do Vale do Paraíba, também teve a honra de receber a visita de d. Pedro II e da Princesa Isabel no século XIX. Naquela época, Guará era uma das mais importantes economias cafeeiras da região e da província de São Paulo, concorrendo diretamente com Taubaté, Pindamonhangaba e Bananal.

Anteriormente consultei basicamente dois trabalhos sobre a histórica da cidade:

  1. MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de. O Visconde de Guaratinguetá: Um Titular do Café no Vale do Paraíba. São Paulo, Studio Nobel, 2002.
  2. CAMARGO, Conceição Borges Ribeiro. Passagem da Princesa Isabel em Guaratinguetá e Aparecida. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Paulista, São Paulo, 67:291-95, 1970.

O livros sobre o Visconde de Guaratinguetá me ajudou imensamente. Há um capítulo dedicado às visitas de d. Pedro II e da Princesa Isabel em Guará. A pesquisa realizada pelo Carlos Eugênio é extensa e muito bem fundamentada. Ele cita todas as fontes, arquivos, conjuntos documentais e acrescenta comentários de outros autores e documentos sobre determinado assunto. Um trabalho profissional. Esse livro pode ser comprado em qualquer loja online ou livraria. Recomendo!

Com base nas informações obtidas, fui à campo. Visitei o Museu Frei Galvão, onde localiza-se o Arquivo Memória de Guaratinguetá. Muita gente se engana, achando que ali estão as relíquias do primeiro santo brasileiro. O museu só leva o nome do filho mais famoso da cidade, mas não expõe seus pertences. Ali funciona um museu dedicado à história da cidade de Guaratinguetá.

Fui muito bem recebido pela Ana e pela Alice, bibliotecária responsável pelo Arquivo. Thereza Maia, maior especialista sobre a história do Vale do Paraíba é quem coordena as atividades do Arquivo, mas infelizmente ela estava na FLIP, em Paraty, quando fui lá. Não tive a honra de conhecê-la pessoalmente desta vez.

Passei dois dias no Arquivo. pesquisei nos raros jornais que ainda sobrevivem. Há algumas edições, de alguns poucos anos relativos ao período que estou estudando. Mesmo assim, encontrei bastante informação sobre a primeira visita de um membro da família Imperial brasileira ao Vale do Paraíba. Em 1868, a Princesa Isabel foi à Minas Gerais banhar-se nas águas termais de Caxambú e Lambari. Aliás, conheci no Simpósio Nacional de História uma colega historiadora que está estudando essa viagem da Princesa por Minas Gerais. Bom, quando ela e o Conde D’Eu saíram de Minas, se dirigiram á São Paulo. O objetivo era visitar a capital da província e as cidades da região de Campinas, porém um chamado da Corte interrompeu a visita da Princesa. Era a Guerra do Paraguai que chamava pelo Conde D’Eu. Os dois foram apenas até Taubaté, interromperam a viagem e regressaram à Corte. Sorte para minha pesquisa.

Pude perceber na documentação, principalmente nos jornais, que essa visita da Princesa Isabel foi marcada por misticismo e lendas. A Princesa era muito devota de Nossa Senhora Aparecida e aproveitou sua viagem para visitar a capela da santa. Aparecida na época era pertencente à Guará. Em sua estada na cidade, visitou por duas vezes a capela. Foi o bastante para surgirem as mais mirabolantes histórias que iam desde libertação de escravos até eventos sobrenaturais. Há dois fatos envolvendo a Princesa Isabel que vale à pena mencionar.

O primeiro realmente aconteceu e foi relatado pelo jornal “O Parahyba”. Um guarda nacional foi preso na cidade de Lorena pelo autoritário delegado daquela cidade. Ao invés de enviá-lo em liberdade para São Paulo, como deveria fazer, mandou acorrentá-lo e ir debaixo de forte temporal. Quando o guarda nacional passou pela capela de Nsa. Sra. Aparecida, pediu para parar e rezar para a santa. Neste exato momento, a comitiva da Princesa Isabel e do Conde D’Eu chegaram à capela. O pobre do guarda se jogou aos pés da Princesa e rogou-lhe clemência. No mesmo momento, a Princesa solicitou ao Conde D’Eu que ordenasse a libertação do presidiário. Daí para o acontecimento virar milagre foi um pulo.

O segundo relato que trago para vocês trata-se de uma especulação que nunca foi comprovada. Nessa primeira visita da Princesa, corre a história de que ela pediu intercessão da santa para que ela engravidasse de um varão, herdeiro do Império. Ao que parece, ela vinha tendo dificuldades em engravidar, o que justificava sua viagem para se tratar nas águas termais de Minas Gerais. Junto à solicitação da graça, a Princesa Isabel doou um manto azul real com 21 pedras preciosas: mesmo manto que veste a imagem da padroeira do Brasil. 16 anos depois, em 1884, a Princesa voltou à capela de Nossa Senhora Aparecida, com seu marido e seus 3 filhos, para agradecer a graça alcançada. Deixou de presente uma coroa de ouro para ser colocada na imagem da santa. Dizem que, como o costume manda, a Princesa varreu toda a capela e colocou um pouco da poeira dentro de seu corpete.

Difícil saber o que é verdade e o que é criação do imaginário popular. Mas, o que mais importa para o meu trabalho é justamente analisar o motivo que levou essas pessoas a criar uma imagem de quase santa para a Princesa Imperial. Que fascínio a imagem da “Redentora” causava naquelas pessoas para acreditarem que ela simbolizava um elo entre Nossa Senhora Aparecida e o povo brasileiro comum? Perguntas que aos poucos vou encontrando respostas.

Simpósio Nacional de História

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Essa semana que passou estive no XXVI Simpósio Nacional de História, que aconteceu na USP em São Paulo.

Participei do mini-curso “Economia, Política e Sociedade no Brasil Império do Segundo Reinado”, ministrado pelo doutorando da USP, Hernán Sáez e pelo doutorando da PUC-SP, Mateus Fernandes. Enquanto o primeiro historiador trabalhou a questão econômica da provincialização da emissão de moedas e a questão política nas discussões no Parlamento brasileiro, o segundo historiador tratou sobre as movimentações em torno das leis abolicionistas no século XIX. Ambos, utilizaram como premissa a quebra dos paradigmas atuais da historiografia brasileira sobre o Império no Brasil.

São estereótipos estabelecidos ao longo de nossa recente história de que no Império havia apenas duas facções políticas: saquaremas (conservadores) ou luzias (liberais); ou que todos os políticos provinham dos bancos universitários e eram proprietários de terra; ou ainda que o Imperador d. Pedro II, com seu poder Moderador, centralizava tudo e não dialogava com os deputados, senadores ou presidentes de Província.

O professor Hernán mostrou com fatos e dados que essas são visões simplistas e generalizantes, não correspondendo ao que os documentos mostram. Mostrou que até historiadores consagrados como José Murillo de Carvalho também utilizam dessa prática de generalizar questões não tão simples sobre a economia, política e sociedade no Império. Nesse sentido, o mini-curso me auxiliou bastante na compreensão da estrutura do Brasil da segunda metade do século XIX, período que minha pesquisa abrange.

Além deste ótimo curso, também aproveitei para assistir a alguns Simpósios sobre os mais diversos temas como, por exemplo, a história dos Quadrinhos no Brasil. Também tive a oportunidade de estar na conferência do professor da Universidade de Calgary (EUA), Hendrix Kraay, sobre as festas cívicas no Brasil Imperial. De lá, tirei referências para meu trabalho.

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Em Tempo: Exposição das fotos da Família Imperial no exílio

Nesse meio tempo, recebi uma dica valiosíssima da minha amiga e colega de sala, Alessandra. No Instituto Moreira Salles (Itaú), estão expostas uma coleção de 170 fotografias da Família Imperial, em especial as que foram produzidas no exílio, após o golpe da República em 1889. Esta coleção pertencia ao príncipe d. João de Orleans e Bragança e mostra retratos oficiais e particulares de d. Pedro II, Princesa Isabel, Conde D’Eu e família. Vale muito à pena conhecer esse lado particular da Família Imperial brasileira. Abaixo, algumas fotos.

 

 

Quando a pesquisa te persegue

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Uma história interessante acaba de acontecer comigo. Vou contar-lhes nos mínimos detalhes.

Em 2009, antes de começar o curso de História na Universidade de Taubaté, fui a São José do Barreiro. Queria apenas passar um final de semana agradável, visitar alguns prédios históricos e me aventurar na Serra da Bocaina. Lá, tinha visitado o centro da cidade, tirado fotos de alguns casarões, conhecido a Igreja Matriz e feito um tour pela famosa Fazenda Pau D’Alho, que hospedou d. Pedro I, quando ia ao Ipiranga proclamar a Independência.
Conversando com a Marta, proprietária da pousada que fiquei hospedado, ela me indicou uma outra fazenda que ficava a 40 min. à pé, numa estrada de terra. Não sei daonde tirei coragem e fui, caminhando sozinho, debaixo de sol, pela estrada de terra. Cheguei à Fazenda São Francisco e logo fiquei encantado com tudo o que vi. Um casarão de 1813, restaurado e preservado plenamente. Os proprietários, seu Walton e dona Eliana, apaixonados por aquela fazenda, dedicaram largos anos na restauração da casa e na recuperação da história daquela local. Mobílias impecáveis, belíssimos quadros, pratarias, lustres e, principalmente, a estrutura da casa conservada como era no século XIX, sem modificações. Na parte debaixo da casa tinha um pequeno museu organizado com peças resgatadas ao longo do tempo pelo seu Walton e por dona Eliana. Lembro que na época me chamou a atenção o oratório que possuía o símbolo da Maçonaria escondido em seu interior.
Bom, eis que estou pesquisando para essa pesquisa que descrevo e vejo um vídeo do programa “Grandes Fazendas” do Canal Rural falando sobre esta fazenda. Comecei a assistir para matar a saudade. E aos 18 min e 45 seg do vídeo, olha o que é encontrei:
Ou será que essa peça do quebra-cabeça que estou montando é que me encontrou?

As visitas de d. Pedro II em Taubaté

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Ao voltar do Rio de Janeiro, me dediquei a pesquisar nos arquivos e bibliotecas públicas das cidades do Vale do Paraíba, principalmente naquelas que tinha indícios da passagem do Imperador ou de sua filha, a  Princesa Isabel. Comecei por Taubaté, por ser a cidade onde estudo e trabalho e também por conhecer o “caminho das pedras”.

Meu primeiro passo se deu na Biblioteca da UNITAU e na Biblioteca Municipal, onde selecionei uma lista de cerca de 15 livros contendo relatos da história da cidade e de vultos nobres do passado. Na lista abaixo, vocês podem observar alguns dos livros que mais trouxeram informações valiosas sobre as passagens de d. Pedro II e da Princesa Isabel por Taubaté. São livros de vários tipos, desde obras de historiadores renomados e que procuraram dar um caráter científico à pesquisa originária do livro, até obras de escritores, políticos e simplesmente amantes da cidade natal, que desejavam relatar o que ouviram de “história” de Taubaté ao longo de suas vidas. Tudo foi válido na hora de compor o panorama de atuação da minha pesquisa. Mais válido ainda, foram as fontes documentais indicadas pelos autores, que facilitou meu caminho dentro do Arquivo Municipal de Taubaté.

  1. ABREU, Maria Morgado de. Taubaté, de Centro Irradiador de Bandeirismo a Centro Industrial e Universitário do Vale do Paraíba. Aparecida, Ed. Santuário, 1985. Pg. 60.
  2. MARTINS, Gilberto. Taubaté nos seus Primeiros Tempos. Taubaté, Empr. Gráf. Edit. Taubaté Ltda., 1973.
  3. ORTIZ, José Bernardo. São Francisco das Chagas de Taubaté. São Paulo, Imprensa Oficial do Estado, 1996.
  4. TOLEDO, Francisco de Paula. História do Município de Taubaté. 2ª edição anotada. Taubaté: Prefeitura Municipal, 1976. Pg. 63
  5. GUISARD, Oswaldo Barbosa. Taubaté no aflorar do século. Taubaté, edição do autor, 1974
  6. GUISARD FILHO, Felix. Convento de Santa Clara, achegas à história de Taubaté. São Paulo, Athena Editora, 1938. Pg. 79 e 80.
  7. BERINGHS, Emilio Amadei. Conversando com a saudade: crônicas. São Paulo, Bisordi, 1971.
  8. MELLO JR., Antonio. Hospital Santa Izabel. Taubaté, Egetal, 1976.

Com a pesquisa que já tinha feito na Internet e com os dados que encontrei nos diversos livros que pesquisei, pude delimitar minha pesquisa documental, pelo menos no que tange a datas. Aliás, a Internet foi fundamental para dar o ponta-pé inicial à minha pesquisa. É óbvio que há muita informação incompleta e errada, mas o que já está publicado na rede ajuda a dar um norte para o pesquisador. Utilizar a Internet como ferramenta de pesquisa é imprescindível e poupa muito tempo do historiador.

1846, 1868, 1878, 1884 e 1886 eram os anos que tinha encontrado informações de possíveis visitas do monarca em solo taubateano. A partir daí, fui ao CDPH (Centro de Pesquisa e Documentação Histórica) e ao Arquivo Municipal pesquisar principalmente nos jornais da época e nas atas da Câmara municipal. No CDPH, pude pesquisar as atas da Câmara e delimitar ainda mais as datas em que o Imperador esteve na cidade. Com essas informações fui ao Arquivo Municipal pesquisar principalmente nos jornais da época. Tenho a obrigação de agradecer a d. Lia Carolina, coordenadora do Arquivo de Taubaté e a Amanda, que também trabalha lá, pela fundamental ajuda que me deram na minha pesquisa documental. Encontrei relatos publicados em jornais de outras épocas e mais livros que citavam a passagem do Imperador por Taubaté graças à ajuda delas. Isso sem contar a educação e paciência que as duas me atenderam durante as minhas três visitas ao Arquivo.

Arquivo Municipal de Taubaté

A pesquisa foi árdua no começo. Não estava encontrando muitas informações nos jornais. Muitos jornais se perderam no tempo e as edições que relataram tão ilustre visita não chegaram até nossos dias. Porém, com o avanço da pesquisa, comecei a encontrar informações valiosíssimas. Uma informação levava a outra e com isso fui montando o meu quebra-cabeça. As datas foram se confirmando e eu fui enriquecendo as descrições das visitas de d. Pedro II e de sua filha a Taubaté.

Em 1846, o Imperador não passou por Taubaté, mas uma comissão de cidadãos da cidade foi até São Paulo encontrar com o monarca e lhe pedir para que implantasse um Liceu de Artes e Ofícios no atual Convento Santa Clara. Anos depois, o Liceu estava em pleno funcionamento. Descobri também um erro na história de Taubaté. Muitos livros que li, inclusive de historiadores consagrados na cidade, citavam 1876 como a primeira visita de d. Pedro II à cidade. Tanto nas atas da Câmara, como nos jornais não há qualquer menção a visita do monarca nesta data. Pelo contrário, essa primeira visita deu-se em 1878, dois anos após. Creio que todos esses historiadores se basearam em um artigo do Felix Guisard Filho, publicado num jornal de 1945, onde ele cita essa visita, mas com a data errada. Faltou a esses historiadores aprofundar a pesquisa nos documentos da época.

Há muitos outros relatos e descrições das visitas que d. Pedro II fez a Taubaté (1878 e 1886) e também as que a Princesa Isabel fez (1868 e 1884). Eles visitaram as igrejas, hospitais, conventos e até a cadeia da cidade. Esticaram a viagem até Tremembé e Caçapava. E sempre se hospedaram na casa daquele que era o homem mais poderoso da cidade: o barão e depois Visconde de Tremembé, avô de Monteiro Lobato.

Gostei do que encontrei sobre Taubaté, tanto nos documentos do Arquivo Municipal e no CDPH, quanto nos livros sobre a história da cidade. Obviamente que gostaria de ter encontrado mais informação, mas o que coletei já daria uma boa história.

O Imperador fotógrafo

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Uma pausa na narrativa de minhas pesquisas. D. Pedro II, além de Imperador, era um exímio observador das paisagens por onde passava e das pessoas que conhecia. A fotografia era, com certeza, uma das suas maiores paixões, seja por experimentos pessoais, seja como registro artístico e científico dos tantos lugares por onde passou. As mais fascinantes são as fotografias tiradas por sua comissão científica nas viagens ao exterior, tanto para países conhecidos como os da Europa e os EUA, mas também as longínquas regiões do Oriente Médio, África e China. As fotografias são tão importantes que irão virar patrimônio histórico da humanidade pela UNESCO.

A Biblioteca Nacional construiu um site onde estão todos os álbuns fotográficos guardados cuidadosamente durante os mais de 120 anos. São obras fascinantes, como esses exemplos abaixo. Viaje junto com o Imperador, clicando aqui.

Família chinesa - 1874, 1875

Oeste dos EUA - 1871, 1873

Índios americanos - 1871

Árabe - séc XIX

Dom Pedro II no Egito - séc XIX

 

Bibliografia: a primeira estação

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Todo bom trabalho de pesquisa deve começar pelo básico: livros. Ler tudo o que já escreveram sobre seu tema é algo essencial, principalmente quando se trata de uma monografia. A bibliografia de uma pesquisa é a primeira parte que uma banca avaliadora ou um historiador vai olhar, além, claro, da metodologia aplicada no trabalho. Há alguns livros que são como mantra para determinados assuntos. Se você não utilizá-los, pode ter certeza que quem está avaliando seu trabalho o analisará com um pouco de desprezo. Eu não concordo muito com isto, mas nem sempre as regras da Academia são plausíveis para todos. Acredito que livros e obras são temporais, como toda a história da humanidade. O que é correto hoje, pode ser errado amanhã. O que é inovador pode se tornar obsoleto. Há muitos livros que não emplacaram, não venderam e não se tornaram “bibliografia obrigatória” por vários motivos e nem por isso podem ser desqualificados ou não utilizados como base fundamental de uma pesquisa.

Vejam o caso de Norbert Elias (1897 – 1990), um dos autores que estou utilizando para escrever a parte teórica da minha pesquisa. Elias era judeu em plena Alemanha nazista. Teve que se exilar na França e depois ir morar na Inglaterra, onde começou a sua produção na área da sociologia. Escreveu verdadeiros tratados sobre o comportamento humano, abrangendo temas renegados pela História e pela Sociologia como o sexo, a etiqueta, a violência, etc. Devido a circunstâncias históricas, Elias ficou durante um longo período como um autor marginal. Somente nos ano setenta é que uma nova geração de teóricos “ressuscitaram” seus trabalhos e começaram a enxergá-los com outros olhos. Hoje, Norbert Elias é considerado um dos mais influentes sociólogos de todos os tempos. Imaginem então, quantos autores e livros brilhantes não estão empoeirando nos fundos das bibliotecas por diversos motivos?

Como, infelizmente, tenho que “dançar conforme a regra”, incluí em minha bibliografia os livros clássicos sobre o tema de minha pesquisa. Para estudar a mística da realeza e as formas criadas pela monarquia para legitimar seu poder, me baseei em dois livros clássicos. O primeiro é “A Fabricação do Rei” do inglês Peter Burke, que narra como foi construída a imagem do “Rei Sol”, Luís XIV em pleno século XVII e  XVIII. Um bom livro para publicitários e marqueteiros pessoais. Podemos afirmar que as formas de “publicidade” das monarquias modernas são baseadas nas técnicas desenvolvidas ao extremo pelos ministros de Luis XIV, principalmente por Colbert.

O segundo livro base para minha pesquisa é “Os reis taumaturgos” do francês consagrado pela historiografia, Marc Bloch. Esta obra-prima de Bloch conta como surgiu e se perpetuou a crença de que os reis detinham o poder de cura de um determinado tipo de doença, apenas com o toque de suas mãos. Ele narra desde o possível surgimento dessa crença na Idade Média até os resquícios no início do século XX, quando o livro foi escrito. O que mais impressiona é a quantidade de documentos utilizados na pesquisa de Bloch.

Precisava ainda afunilar ainda mais sobre meu tema, afinal estou estudando a monarquia no Brasil. Para o embasamento necessário sobre o reinado de d. Pedro II e todo o aparato utilizado pela monarquia brasileira para criar uma imaginário quase místico sobre a figura do nosso Imperador, busquei dois livros daquela que é considerada hoje a maior especialista em Império no Brasil: Lilia Schwarcz. O primeiro livro foi “As barbas do Imperador”, livro que me inspirou a fazer essa pesquisa 9e muitas outras que estão por vir). Esse livro é fascinante, com uma linguagem acessível a todo tipo de leitor (historiador ou não) e uma vasta coleção de imagens que dão um charme a mais à obra. Na FLIP (Festa Literária Internacional de Paraty) de 2010 pude encontrar com a própria Lilia e agradecê-la pessoalmente pela obra, pedindo, claro, algumas dicas sobre minha pesquisa. Inesquecível!

Outro livro da mesma autora foi “O Império em procissão”, uma pequena obra, quase complemento do “As barbas do Imperador”, mas que foca exclusivamente nas festas oficiais e populares ocorridas durante o segundo Reinado e que eram utilizadas como forma de ora divinizar a figura do monarca, ora popularizá-lo. D. Pedro II tinha um extenso calendário de festas e cerimônias oficiais para participar, mas ainda arranjava tempo para descer de seu trono e caminhar junto com a população em uma procissão do Divino, por exemplo.

Quando pensei que minhas leituras estavam suficientemente realizadas, eis que me deparo com a necessidade de conhecer melhor o que foi produzido sobre a história de cada cidade do Vale do Paraíba, por onde d. Pedro II e a Princesa Isabel passaram. Afinal, se eu li sobre a construção da mística da realeza e as formas de legitimação do seu poder e depois sobre as formas que a monarquia brasileira encontrou de reforçar seu poder, não poderia deixar de conhecer como as populações e elites locais receberam esse “teatro do poder”, como se relacionaram e perceberam essa teatralização. Foi aí que fiz uma lista extensa de livros que relatam as passagens da Família Imperial pelas cidades de Caçapava, Taubaté, Tremembé, Pindamonhangaba, Guaratinguetá, Aparecida, Lorena, Cachoeira Paulista, Cruzeiro, Bananal e Areias, até eu descobrir mais alguma cidade por onde nosso monarca “dignou presentar com Vossa Augusta presença”.

Tudo começa no Rio

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Como toda viagem de nosso ilustríssimo monarca, o trem sempre sai da capital do Império, da Corte, do Rio de Janeiro. E foi lá que iniciei minha pesquisa.

Visitei o Arquivo Nacional e a Biblioteca Nacional. Foi uma missão quase impossível, pois tinha apenas 3 dias para realizar uma pesquisa quilométrica e enfrentar a burocracia insensata do Arquivo Nacional. Só para se ter uma ideia, eles solicitam no mínimo 3 dias úteis para processar seu pedido e entregar os documentos, ou seja, se eu pedisse na quarta-feira (quando cheguei ao Rio), só iriam me entregar na segunda-feira (e eu ia embora no sábado de manhã). Graças a uma alma bondosa e compreensiva consegui acelerar o processo e receber meus documentos em 2 dias, na sexta-feira. Agradeço imensamente a Rosane do Arquivo Nacional, que teve a sensibilidade de perceber que eu vinha de longe e só tinha aqueles poucos dias para realizar minha pesquisa. Sua ajuda foi fundamental.

No primeiro dia me dediquei a selecionar os documentos que pretendia pesquisar no Arquivo Nacional. Uma imensidão de fichas, gavetas e armários. Mesmo com uma pré-seleção feita pelo site do AN, deu trabalho descobrir e encontrar o que realmente iria ajudar a minha pesquisa.

Quinta-feira, o segundo dia, foi dedicado à Biblioteca Nacional. Uma construção enorme e imponente só poderia trazer bons ventos para minha pequena aventura em terras cariocas. Mas, aí ficou minha maior decepção. Passei o dia todo vasculhando a obra de Begonha Bediaga, “Diário do Imperador d. Pedro II, 1840-1891“, principalmente o CD-rom que acompanha e contém todos os diários de d. Pedro II transcritos e digitalizados. A obra é fenomenal, um belo trabalho. Porém, o Imperador não escreveu nenhuma linha a respeito de suas passagens pelo Vale do Paraíba. Há somente um citação da viagem feita pelo Imperador em 1878: “Guaratinguetá, Pindamonhangaba”. Somente isto e nada mais.

Mesmo assim, foi de grande valia a obra de Begonha Bediaga. As análises que ela fez sobre os diários e sobre as viagens do Imperador irão embasar melhor minha pesquisa. Destaco abaixo um trecho do livro que considero uma ótima justificativa para minha pesquisa (pg. 33):

Além disso, em um momento marcado pela instabilidade política, as fronteiras eram, de certa forma, fortalecidas e, mesmo, justificadas pela presença do monarca, que tornava “memoráveis” as suas passagens. Era como se, na ótica local, o simples trajeto da comitiva imperial legitimasse o pertencimento a esse Estado, que não era sequer nação.

Nesta toada, fui ao meu último dia de pesquisa. No Arquivo Nacional uma pilha enorme de documentos esperava minha pessoa. Foram 8 horas direto de pesquisa, sem beber água, sem comer e nem almoçar. Pela quantidade de documentos e por ser o último dia que eu ficaria no Rio de Janeiro, não poderia dar-me ao “luxo” de almoçar! O sacrifício foi válido, pois encontrei alguns documentos preciosos para minha pesquisa, principalmente do início do reinado de d. Pedro II e da sua primeira visita à Província de S. Paulo. Abaixo, coloco uma foto de um dos documentos que encontrei por lá (clique na imagem para ampliá-la).

O início da minha procura sobre os passos do Imperador no Vale do Paraíba foi compensador, mas esperava mais. Talvez tenha deixado muito documento importante para trás, talvez precisasse de mais tempo… mas as provas que trouxe do Rio de Janeiro me ajudaram a organizar as informações que tinha e a continuar a investigar por onde d. Pedro II teria andado e o que teria feito por essas bandas valeparaibanas.

O primeiro passo

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O primeiro passo é sempre o mais difícil. Começar esse trabalho de pesquisa não foi nada animador. O tema era interessante, mas as informações estavam dispersas, desencontradas e muitas vezes sem embasamento. Pouco consegui encontrar no início e quase desisti de pesquisar sobre as viagens que nosso último monarca e sua filha fizeram pelas cidades do Vale do Paraíba. Quase.

Meu fascínio pelo período Imperial da História do Brasil transcende a seara acadêmica. Estudar esse período é fascinante, principalmente porque quase tudo o que nos foi ensinado até hoje sobre o Império do Brasil está contaminado com uma visão ideológica atrasada. Por outro lado, há muito o que estudar ainda sobre o período. Vejam a revisão historiográfica que a Guerra do Paraguai tem passado nas últimas décadas.

O que teria pensado d. Pedro II e a Princesa Isabel ao visitarem as poderosas cidades valeparaibanas, produtoras de café e de barões? Como teriam sido preparadas as recepções ao “Monarca dos trópicos”? O que se passou nas mentes da gente da terra, das elites locais, do povo do interior do país ao avistarem e, em alguns casos, beijado a mão de Vossa Majestade Imperial? Qual a estratégia política por trás dessas viagens da comitiva Imperial? O que se esperava dos barões, viscondes e condes da região e o que eles esperavam do Imperador? Estas são algumas das questões que me perturbaram durante alguns bons meses… e ainda me perturbam.

É com essas perguntas que dou o primeiro passo nesse blog. Quero construir um espaço onde possa pontuar minhas dúvidas ao longo da pesquisa e contar com a ajuda de você que está lendo esse primeiro post para chegarmos a uma conclusão. Espero também poder divulgar aqui os achados nos arquivos municipais, bibliotecas, centros de pesquisa, para quem sabe auxiliar outras pesquisas e outros tantos historiadores.

Peguem seus bilhetes, sentem em seus lugares que o trem está a postos para seguir pela Estrada de Ferro Pedro II!

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